terça-feira, 28 de abril de 2020

NO RADAR COM HERETICAE


A seção NO RADAR de hoje conta com a participação da banda HERETICAE (Londrina - PR), em atividade desde 2014 fazendo um trabalho singular e muito interessante! Batemos um papo sobre o mais recente trabalho, “Ecos do Atlântico”, que é sem dúvidas um belo material que precisa ser conhecido por quem gosta de uma sonoridade repleta de peso e envolto de um tema conceitual instigante. 

1 – O HERETICAE lançou seu primeiro trabalho intitulado “Ecos do Atlântico”, qual a sensação da banda em relação ao seu trabalho de estreia e como estão trabalhando na divulgação!?
‘Ecos do Atlântico’ é nosso primeiro álbum, não foi nosso primeiro trabalho propriamente dito – temos um EP e um single lançados em 2017 e 2015, respectivamente. A sensação da banda como um todo, assim como o retorno dado por nossos amigos/as mais próximos, foi de grande satisfação com o resultado. Foi um trabalho longo, feito da maneira mais acessível para nós quatro em questão de tempo e de dinheiro, e sabemos que fizemos o melhor que podíamos com o que tínhamos.
A divulgação, por conta da quarentena, tem ocorrido exclusivamente via internet até o momento – por redes sociais e por e-mail. Nossos amigos/as e parceiros/as têm ajudado da melhor maneira que lhes é possível, e já conseguimos um bom alcance pelo Bandcamp.


2 – De início um ponto que chama atenção é a abordagem de um tema totalmente ligado as raízes da América do Sul. Algo muito bem elaborado e conectado com o nosso passado ancestral. Gostaria de saber um pouco da elaboração desse conceito, podemos dizer que “Ecos do Atlântico” é um disco conceitual?
Sim, é um disco conceitual. Desde o início foi projetado para ser, e tudo o que viemos fazendo no último ano gira em torno de seu conceito.
O conceito se formou através de ideias e reflexões que nós tínhamos em nossas conversas. Cristiano, Cleverson e eu (Dalton) somos amigos há bastante tempo, e sempre que nos encontramos, a ideia vai longe, por assim dizer, rs. Nossos posicionamentos políticos e ideais de vida e sociedade quase sempre são o centro de nossas conversas, e com certeza os anos de trocas de experiências refletiram na proposta desse trabalho. O Chico (baterista) entrou um pouco mais tarde na banda, nos idos de 2018, mas por mais que a ideia já estava consolidada, suas visões certamente somam com o todo da banda também.
Cabe ainda mencionar o fato do Cleverson ser afro-brasileiro, e o Chico e eu sermos descendentes de indígenas, o que foi um pilar central na consolidação da ideia do álbum. Por fim, basicamente, decidimos voltar os olhos à nossa história, à história dos povos colonizados e escravizados das Américas, ao invés de seguir as ideias das bandas europeias do mainstream do metal.

3 – Seguindo, acredito o conceito, a banda também tem outro fator muito bem-vindo ao Underground Brasileiro, que são as letras em português. Por incrível que possa parecer, as bandas que cantam em português no Brasil, ainda têm certa resistência por parte de alguns tradicionalistas. O que é para o HERETICAE não abrir mão de sua língua pátria?
Essa foi outra decisão que se desenvolveu ao longo de meses, que faz parte do conceito do álbum, mas ainda é algo “maior” do que ele. Posso afirmar que o ponto de virada nisso foi a passagem de Rômulo Machado na banda (final de 2017 ao início de 2018). Ele, que já tinha um projeto solo chamado Iamí, já fazia músicas em português se tratando de temas similares ao que adotamos. Nesse sentido, suas contribuições foram importantíssimas, por mais que sua passagem na banda tenha sido breve. A partir disso, transcrevi a letra da então ‘Não Servirá!’ para o português, e em seguida escrevi, com ajuda do próprio Rômulo, a letra da ‘A Ferro e Fogo’.
Assim, desenvolvendo cada vez mais a ideia do álbum, e procurando conhecer da melhor maneira possível questões ligadas à imperialismo, resistência anticolonialista e posteriormente até mesmo fascismo, assumimos a escolha do português como uma escolha política – afinal, pouco sentido faria falar de luta anticolonialista em inglês, a língua que mais representa o imperialismo em nossos tempos. Entretanto, para além da política, apreciamos a beleza da língua portuguesa brasileira, e pessoalmente posso dizer que é maravilhoso descobrir o leque de possibilidades de escrita que ela oferece.


4 - “Ecos do Atlântico” tem uma gravação bem legal e bastante referências musicais! Cabe a nós, ouvintes escutar e termos nossa interpretação. Porém, gostaria de saber quais são as referências musicais da banda e como funciona o processo de composição!
Para ser bem sincero, são tantas referências que é difícil dizer. Acho que os pilares centrais de nossas influências como fãs de música pesada são Sepultura (por parte do Cleverson e Chico) e Behemoth (por parte do Cristiano e eu), porém estaria mentindo se dissesse que as influências para esse trabalho se limitam a apenas ao gênero do metal.
O processo de composição é igualmente complicado de explicar. Todas as músicas tiveram a mão de todos da banda, e muitas delas ainda tiveram a mão de ex-membros. Quanto às que compomos só entre nós quatro, cada uma saiu de um jeito diferente: teve música que saiu de dentro de outra música, teve música que um de nós chegou com a estrutura “pronta” e só acertamos os detalhes em conjunto, teve música que saiu espontaneamente entre um riff e outro.
O caso mais bizarro que vale a pena comentar foi o da ‘A Cruz e a Águia’. Ela foi uma das primeiras composições dessa nova leva, feita de uma forma totalmente espontânea em uma tarde na casa do Cleverson, muito antes do Chico entrar na banda. Mas praticamente a esquecemos ao longo dos meses! Tanto esquecemos que mal a ensaiamos antes de entrar em estúdio para gravar a bateria. Resultado: o Chico, com ajuda do Cleverson, praticamente compôs a linha da bateria dessa música na hora da gravação, hahaha. E, mesmo após isso, eu fui terminar a letra literalmente na noite anterior do dia em que eu gravei as vozes. Foi tudo feito de uma maneira totalmente espontânea.
Enfim, a regra principal foi: não existe regra, rs.

5 – Quais as próximas metas da banda, o que podemos esperar do HERETICAE!!!! Agradeço imensamente, o espaço é de você, obrigado!
A meta até então é esperar a quarentena acabar, haha. Enquanto isso, tá rolando divulgação online. Entretanto, antes da pandemia estourar, estávamos engatando o início da gravação de outro clipe – cujo roteiro já está pronto, inclusive –, estávamos tirando do papel o planejamento de uma turnê de divulgação, e também há algumas novas composições surgindo já. No mais, estamos aguardando a situação de calamidade nos dar um horizonte melhor pra retomar esses planejamentos. Saudade de tocar é o que não falta.
Por fim, muito obrigado pelo espaço em seu blog! Foi um prazer responder à essa entrevista.
Valeu!



Por Vitor Carnelossi


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Desde 2013 produzindo matérias e entrevistas para grande rede.
Editor responsável - Vitor Carnelossi



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